Hipofosfatemia pode causar ou piorar insuficiência cardíaca?


Por Mardson Medeiros  /


Hipofosfatemia pode estar presente em até 5% dos pacientes internados (níveis menores do que 2,5 mg/dL ou 0,80 mmol/L). Prevalências maiores podem ser encontradas em pacientes com abuso de álcool, sépticos ou vítimas de trauma. Hipofosfatemia severa (menor que 1 mg/dL ou 0,32 mmol/L) são menos frequentes e podem levar a sintomas mentais ou físicos.

Há quatro mecanismos principais, que podem causar hipofosfatemia:

- redistribuição do fosfato do extracelular para o intracelular, como ocorre na estimulação da glicólise (administração de insulina, glicose, glucagon ou epinefrina);

- redução da absorção intestinal de fósforo (diarreia crônica, uso prolongado de antiácidos)

- aumento da excreção urinária de fósforo (hiperparatireoidismo, deficiência de vitamina D e síndromes raras como a de Fanconi, que causam perda renal de fósforo. Outras causas seriam diurese osmótica, administração venosa de ferro e alguns agentes quimioterápicos);

- Remoção através das sessões de diálise (a hipofosfatemia é observada em muitos pacientes que recebem terapia de substituição renal contínua, em grande parte devido à remoção de fosfato com os resíduos no fluido dialisado).

E qual a relação dos níveis de fósforo com a função cardíaca?

As manifestações clínicas vão depender da gravidade e da velocidade de instalação da hipofosfatemia.

A maioria dos pacientes sintomáticos apresenta a concentração plasmática do fosfato abaixo de 1 mg/dL.

A depleção intracelular de ATP (adenosina trifosfato) pode causar encefalopatia, além de ter repercussão no músculo esquelético, com redução na contratilidade cardíaca, insuficiência respiratória pela diminuição na contratilidade diafragmática, disfagia, miopatia proximal ou até mesmo íleo paralítico.

Uma instalação aguda e rapidamente severa de hipofosfatemia pode causar rabdomiólise, hemólise ou trombocitopenia. 

A etiologia da hipofosfatemia, geralmente, é definida através da história clínica. Contudo, nos casos duvidosos, pode-se dosar a excreção de fósforo na urina de 24 horas ou calcular, em amostra isolada, a fração de excreção de fósforo. Neste último caso, usa-se a seguinte fórmula: FePO4 = [1 - (fósforo na urina x creatinina sérica) / (fósforo sérico x creatinina na urina)].

Excreção urinária de fósforo acima de 100 mg por dia e FePO4 acima de 5% seriam indicativos de que as perdas renais representariam o mecanismo de depleção.

Sintomas de hipofosfatemia raramente ocorrem a menos que a concentração de fosfato esteja abaixo de 2 mg/dL. Nos casos mais leves, a resolução da causa basal pode ser suficiente (exemplo: reposição de vitamina D, quando está reduzida).

E como fazer a reposição de fósforo?

Nos casos assintomáticos e com fosfato < 2,0 mg/dL, pode-se fazer reposição oral.

Pacientes sintomáticos com fosfato entre 1,0 e 1,9 mg/dL, também pode-se repor por via oral. Usualmente, o tratamento intravenoso fica reservado para níveis abaixo de 1,0 mg/dL e modifica-se para via oral quando ultrapassar 1,5 mg/dL.

A reposição deve ser suspensa, quando o fosfato sérico estiver maior ou igual a 2,0 mg/dL, a não ser que haja indicação para reposição crônica, como nos pacientes com perda urinária persistente.

A reposição intravenosa é potencialmente perigosa, pois pode haver precipitação com cálcio, gerando uma variedade de efeitos adversos, incluindo hipocalcemia (devido à ligação com cálcio), insuficiência renal (devido à precipitação de fosfato de cálcio nos rins), além do risco de arritmias cardíacas. Por isto, reservar esta via de administração para os casos com sintomas severos e fosfato < 1,0 mg/dL.

Nos casos mais leves, a reposição oral pode ser feita com leite desnatado, que contenha fósforo na formulação. Outra opção seriam composições de fosfato de sódio ou fosfato de potássio. O principal efeito colateral é gastrointestinal (laxante).

A administração venosa pode ser realizada com o glicerofosfato de sódio, diluído em soro fisiológico.


Fonte: Adaptado do UpToDate, abril de 2022

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